SANFONA

Desde que me conheço por gente (isto nunca ocorreu, é só força de expressão), ou pelo menos no período compreendido entre a adolescência e as beiradas do portal do meio século, vivi uma situação assaz monótona: pressão 12×8, 80 batidas por minuto quando o coração não estava apaixonado, colesterol legal e 72 quilos. Era como uma cláusula pétrea, qualquer alteração seria vista como um sacrilégio.

Mas sempre tem o “até que”.  Em 2008 eu resolvi dar uma conferida no meu sangue bom e descobri que era um dos ilustres portadores do vírus da hepatite C. Considerando a literatura médica a respeito e meu modus vivendi, a conclusão era no sentido de que eu tinha contraído o tal vírus havia cerca de 28 anos, após uma transfusão de sangue. Caraca!

Isto é história antiga, que já abordei em alguns posts como este, mas parece que ainda não falei de um assunto pós-tratamento. Aliás, o tal tratamento equivale a tomar veneno de cobra para combater soro antiofídico, e provoca uma tonelada de efeitos colaterais. Um deles foi emagrecimento: nos  últimos 90 dias até a última dose fui perdendo cerca de três quilos ao mês, e ainda continuei afinando até chegar aos 60 quilos. A esta altura eu era uma réplica do mapa do Chile, uma espécie de Marco Maciel piorado.

Além do desconforto em ventanias, tive que renovar o guarda-roupa porque pulei do manequim 42 para o 38 sem escalas. Morri numa grana preta. A causa do emagrecimento, descobri depois, foi o completo despirocamento da tireóide, o que explica também os momentos de taquicardia e a taxa de colesterol, que resolveu ficar uma gracinha. Hipertireoidismo brabo.

Comecei o tratamento da tireóide, inaugurando a fase do estica-e-puxa. Tomava o medicamento e de repente o hiper virava hipo, aí eu engordava. Mas hipo também não é legal, então a médica alterava a dose e eu voltava ao hiper e emagrecia. Glândula rebelde, segundo foi diagnosticado. Como a situação era perigosa, acabei me submetendo a um procedimento de choque com o uso de iodo radioativo, e aí eu me tornei um hipotireóidico juramentado. Comecei a recuperar o peso, mas tomando medicamentos para tentar empatar o placar. 

Neste caso específico, o nem-nem é o melhor dos mundos: nem hiper, nem hipo. O problema é que persigo esse ideal de perfeição há mais de dois anos, por enquanto ainda sem sucesso.

A balança ameaça apontar inacreditáveis 80 kg (só falta um) e o manequim 38 passou a fazer parte de um passado recente e incômodo.  Já tive que novamente renovar o guarda-roupa, porque as roupas que tinham se tornado enormes foram doadas. Tudo bem, parcelamento no cartão é pra essas coisas, mas o que se fez de fato urgente e preciso foi atender às lamúrias de Androceu, meu parceiro velho de guerra, que andou tendo crises de claustrofobia e me acusava de aplicar-lhe diariamente um mata-leão.

A solução teve até um certo viés ecológico, porque no fim das contas voltei a criar o bicho solto: comprei uma dezena de cuecas tamanho G, não se descartando o GG nas eventuais manifestações de carência afetiva.

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