AH, A BUROCRACIA!

Já falei aqui neste cafofo sobre o vírus da hepatite C, que me invadiu há algumas décadas e me forçou a um tratamento punk no final dos anos 2000. Chama-se HCV o fidaputa.

Passou-se o tempo, lá por 2017 ouvi por acaso um colega comentar sobre uma lei que estabelecia isenção do imposto de renda para brasileiros acometidos de determinadas moléstias, hepatopatia grave incluída. Não que eu não gostasse de pagar imposto de renda, sempre adorei, mas imaginei que seria divertido não pagar mais.

Apelei a São Google e descobri que precisava me inscrever no gov.br e acionar o canal Meu INSS para dar entrada no processo. Foi relativamente simples, tudo online, juntei toda a documentação de que dispunha, exames laboratoriais e de imagem, biopsia, relatórios médicos, artigos técnicos nacionais e da gringa, e me pus a esperar os 30 dias de prazo autoconcedido pela autarquia para me chamar para um tête-à-tête a título de perícia médica. Passaram os 30 dias e, por volta do 55º, recebo pelo correio um documento informando que meu pleito foi indeferido. Como assim, véio, cadê a perícia?

Vi que havia a possibilidade de recorrer da decisão pelo mesmo canal, e assim o fiz. Escrevi um tratado, juntei novamente a documentação e dei o enter. Mais 30 dias, of course.

E se passaram os tais 30 dias, depois 40, 120, 180, quando faltavam 16 dias para completar dois anos de paciente espera e consultas semanais ao portal, eis que surge um tal acórdão. Alvíssaras, pensei. Começo a ler e vou murchando, o documento é assinado por uma junta de cinco ou seis autoridades no assunto, que declararam ‘conhecer do recurso’ e negar provimento. O motivo? “Total incompetência da turma para julgar o recurso”. Demoraram dois anos para se declararem incompetentes, com o que concordei mas não no sentido que tentaram dar à palavra. Se aquele canal era o único, onde se encaixa a tal incompetência?

Aí meu espírito invariavelmente pacífico se emputeceu. Decidido a ir pro pau, passei a procurar advogados especialistas, achei o Dr. Rodrigo (cabra bom!), combinamos uma parceria no melhor estilo telecatch e fomos à luta.

Pra resumir a encrenca: a inicial data do início de 2022. E recolhe custas, e junta documentação, a União oferece defesa e contestação, meu advogado apresenta contrarrazões, e rola citação, e tome petição, o juizo produz relatório, faz despacho, manifestação e… decisão. Ganhei!

Calma, que melhora. Mas demora. Foi só a decisão de 1º Grau, já eram meados de 2023 e ainda tinha um estoque imenso de esperneios. E eu ali, alprazolam a postos, acompanhando.

Em julho de 2024 o juiz emitiu acórdão confirmando a decisão de 1º Grau, que transitou em julgado em setembro. Eu acho que merecia um chopp.

Como as coisas não funcionam na velocidade que os mortais desejam, somente agora neste aprazível abril de 2025, no mais tardar maio, terei o prazer da ausência do imposto de renda no meu contracheque. A devolução do que paguei indevidamente vai ter que esperar mais um bocadinho mas, pra quem já esperou uma eternidade, tá valendo.

Em resumo, é isso: a espera foi compensada, a União se ferrou comigo e a partir de agora eu sou praticamente uma igreja no quesito imposto.

Chamam a atenção, porém, alguns detalhes:

  • o desrespeito escancarado com que fui tratado pelos iluminados do INSS na fase administrativa, que demoraram dois anos para fazer a caca que fizeram. 
  • a qualidade (ou falta de) com que o lado de lá atuou juridicamente. Além de terem, em diversas ocasiões, detonado a fina flor do Lácio, os advogados da União (leia-se PFN), ainda cometeram horrendos pecados ao defenderem a tese de que a hepatite C constitui um mal menor (mesmo ante a informação em site oficial da FDA norte-americana (que anexei) de que a hepatite C respondia por mais óbitos do que a AIDS no final dos anos 2010). Ainda tiveram a pachorra de afirmar que o juiz não tinha competência para decidir, porque não era médico. Oi? Quando li aquilo, concluí que a União não precisava de inimigos. 
  • O tempo todo agiram como guardiões da chave do cofre, desconsiderando que o espírito da Lei visa garantir que os valores envolvidos sejam revertidos para o suporte a medicamentos, consultas e exames médicos que são constantes e necessários.

Qualidade de vida ao cidadão, difícil que compreendam. 

Esta entrada foi publicada em Sem categoria. Adicione o link permanente aos seus favoritos.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *