Ouvi pela primeira vez a expressão ‘esquerda caviar’ da boca boquirrota do tal de Constantino da Veja, aquela figura cujo cabelo ensebado me leva a concluir que os piolhos ali residentes devem enfrentar graves problemas de colesterol. Ele inclui nesse segmento social as pessoas que, direta ou indiretamente, por meio de declarações ou ações, de alguma forma defenderam ou ainda defendem a liberdade e a justiça, justiça social inclusa, mas que não ostentam sinais exteriores de pobreza ou miséria. Como se sabe, quem é de esquerda ou contra a direita, no mínimo tem a obrigação de passar fome.
Depois a coisa meio que se disseminou entre a autointitulada direita brasileira, culminando com a eleição por aclamação do Chico Buarque como representante-mor da esquerda caviar. O motivo? Ele mora em Paris e, aparentemente, resolveu se desligar das questões político-sociais brasileiras. Não o condeno. Se tivesse a grana que ele tem – conquistada com muito trabalho, diga-se – é bem provável que eu também estaria morando ali na região da Place de l’Etoile. Chega um momento na vida em que remar contra a maré cansa.
O Chico, porém, parece não ligar muito para o que pensam dele:
Analisando bem, acho que me enquadro nessa sub-raça definida pelos playboys da Paulista, porque geralmente me dá nojo o que os endinheirados fazem para ficarem mais endinheirados. Nem é necessário comparar a qualidade e os preços de nossos carros e eletro-eletrônicos com outros países, né? Até porque qualquer conglomerado de comunicação do país afirma sem medo de errar que o problema é a ‘alta carga tributária’. Se as Capitanias Hereditárias afirmam, então deve ser verdade.
Mas vamos a um fato ocorrido semana passada: um amigo me pediu para fazer a instalação do pacote Microsoft Office em seu notebook. Uma vez comprado o programa, fui até sua casa para fazer a instalação e configurações. Foi aí que percebi o inusitado: há pouco mais de um ano comprei a versão 2010 (Home and Student, ou seja, não profissional) do aplicativo, que inclui o Word, Excel, PowerPoint, One Note e Publisher, cujo CD permitia a instalação em até três máquinas ao preço de cerca de R$ 240,00. A versão comprada pelo amigo é a 2013, cujas diferenças em relação ao 2010 ainda não se fizeram notar, a não ser pelo fato de conter somente o Word, o Excel e o PowerPoint, disponíveis para instalação em uma única máquina. O preço? O mesmo que paguei pelo outro. Pausa para a cara de otário.
A isto dá-se o nome clássico de capitalismo selvagem. Para quem foi bancário como eu, é fácil fazer uma análise crítica sobre o assunto, já que os bancos são os maiores pilares desse sistema que paga 6% ao ano pelo seu dindim na poupança e cobra 8 ou 9% ao mês pelo empréstimo. Mas não se iludam: não é de bom tom falar mal disso, sob pena de virar a bola da vez da isenta imprensa brasileira.
Parabéns pelo artigo, Rogério. Essa praga de querer o lucro pelo lucro não é exclusividade brasileira, o que se vê muito é que as multinacionais aproveitam nossa terrinha para praticar aqui o que não podem mais fazer lá fora. Viu o caso das placas do Detran? Escandaloso.
Simone, às vezes cismo que o mau-caratismo brasileiro decorre de uma necessidade de mimese. O fato é que nosso país é um campo absurdamente fértil para o enriquecimento criminoso de gringos de todos os idiomas e matizes, basta ver o quanto somos roubados em nossa fauna, flora e riquezas minerais. No tocante aos negócios, digamos, formais, o que percebo é uma permissividade imoral e suspeita. O que alguns chamam de diplomacia, eu entendo como crime de lesa-pátria.
se isso acontecesse só aí no Brasil já seria trágico, mas infelizmente acontece no mundo inteiro. Até aqui na Camiranga, país berço de várias multinacionais e onde o capitalismo é projeto inacabado, sempre sendo trabalhado para ficar ainda mais selvagem. Como dizia o Gandhi ” a Terra tem recursos imensos para todos, mas insuficiente para a ganância de alguns”. Tem jeito não Negão. O negócio é fazer feito o Chico, parar de remar contra a maré, se divertir com a raiva alheia e ir comer caviar em Paris, até a festa acabar.
Aí nos States a coisa deve ser bem mais braba, porque é a matriz. Essa postura (cultura?) é a raiz de vários males periféricos além da exploração do capital sobre o trabalho e do achaque comercial contra os consumidores. Disso derivam o bullying, a competição antropofágica, o assédio moral/sexual, aquela babaquice típica dos ‘winners’ e ‘losers’, enfim, acho que esse povo tem a obrigação de ser infeliz. Deve ser por isso que de vez em sempre aparece um maluco metendo bala em estudantes e o governo adora jogar bombas no país dos outros.