ODE AO ÓCIO ALHEIO

Pode não ser – ainda – o país da piada pronta, mas o Brasil demonstra grande vocação para ser o país da tragédia iminente. Sempre aparece alguém disposto a botar um bode na sala, e isso provoca, a nós outros simples mortais, verdadeiro pavor de reclamar do que quer que seja. Simplesmente porque ainda pode piorar.

Sempre nos incomodou a vagabundagem remunerada dos nossos valiosos congressistas. Com boa dose de razão, achávamos que não era justo que eles ganhassem aquilo tudo para chegar em Brasília na terça e voltar pra casa na quarta. Por ser Brasil, porém, sempre vem aquela sensaçãozinha sacana do tipo ‘eu era feliz e não sabia’ que faz com que nos sintamos o próprio Iscariotes, mesmo quando temos a certeza de reclamar com justeza e conhecimento de causa.

Provavelmente para mostrar quem é que manda, em 17 dezembro de 2014 nossos amados congressistas, numa demonstração de idolatria ao trabalho ainda estavam em plenário. Às vésperas do Natal, vê se pode, nem na Noruega isso acontece. Já que estavam lá, aproveitaram e votaram favoravelmente ao aumento do próprio salário. Segundo consta, “as votações foram rápidas, com aprovação simbólica dos deputados e nenhum pedido de verificação de quórum”. Ah, tá.

Semana passada tivemos mais uma boa amostra do perigo de mexer com quem está literalmente quieto. Eis que, de repente, bateu cafubira no tal de Cunha e ele resolveu que o Brasil tinha pressa, que havia urgência urgentíssima de votar um projeto de lei de 2004. É, aquele que terceiriza até a casa da mãe Joana. O engraçado nisso é que o relator da urgência é um deputado baiano, mas o projeto em si não tem a menor graça. 

Na forma que foi apresentado e aprovado, o projeto de terceirização representa risco imediato para o País e os trabalhadores. Só é considerado legalzão pela galera que não se lixa para a segurança (80% dos acidentes de trabalho fatais são de terceirizados, dados do IBGE), e não é muito fã de impostos e encargos sociais. Deve ser por isso que os paneleiros da Paulista não se manifestaram.

Como disse aquele gênio da raça do ENEM, temos que deixar de ser egoístas e começar a pensar mais em nós mesmos. Assim, sugiro à galera que pare de cobrar trabalho e produtividade de nossos congressistas. Deixa quieto, é melhor.

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ACHO QUE VOLTEI

Devido ao calo de estimação na C3 (não, não é um carro) que cultivo há mais de duas décadas graças ao bom e velho futebol, convivo com travadas de coluna regularmente. Nem incomoda tanto, já se tornou uma tradição. Meu desafio atual é aturar as travadas do blog, que vêm caminhando a passos largos para virar direito adquirido. O WordPress é até legalzinho, mas com frequência demonstra tolerância zero com atualizações de plug-ins, o que levanta a suspeita de que se trata de um programa de direita, avesso a mudanças.

A partir de 15/03/2015 perdi mais uma vez o acesso ao blog, logo após tentar atualizar um plug-in estatístico. Contatei o pessoal do UOLHost, que foi, como sempre, simpático. E, também como sempre, não resolveu lhufas. Talvez a coisa esteja demorando tanto porque disse isso a eles, que suas intervenções sempre trazem no bojo um sonoro ‘se vira’, mas iniciam com um vocativo respeitoso e terminam com um adorável ‘continuamos à disposição’. Acho que magoaram e resolveram fazer pirraça. Ante o silêncio sepulcral que se sucedeu, tive que fazer contato por telefone para tentar resolver a contenda.

Alguma coisa aconteceu após isso, tanto é que já estou novamente postando, mas vale dizer que o texto foi digitado no Word e colado aqui, porque o editor do WordPress não me permitiu sequer escolher a fonte. A formatação foi para o brejo, mas quando for possível eu conserto. Faltam plug-ins e, agora, sua instalação e/ou atualização está inibida. Ainda não recebi nenhuma comunicação do suporte técnico do UOL, talvez ainda haja esperança de retorno à normalidade.

Oremos.

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BRIGA DE CACHORRO GRANDE

Há algum tempo vêm rolando no Facebook algumas enquetes bobinhas, cuja análise das respostas diz quem você foi em vidas passadas, que super-herói você seria e coisas assim. Ontem a enquete do momento prometia revelar qual o país em que a pessoa deveria ter nascido. Não perdi meu tempo, mas me chamou a atenção a euforia de um rapaz que descobriu que na verdade deveria ser norueguês. Sei lá se ele é tarado em bacalhau, gosta de neve o ano todo ou tem tendências suicidas como a galegada de lá, mas estava feliz da vida e orgulhoso com a ‘descoberta’.

Meu impulso inicial foi concluir que o carinha estava achando o Brasil tão chato que o melhor mesmo era ter nascido na Noruega. Mas aí imaginei que é exatamente gente como ele que tem transformado o país numa coisa muito chata.

O problema é que essa legião que faz o país ficar chato já passou da fase do modismo e avança para a cronificação. Boa parte é composta de inocentes úteis, incapazes de uma análise crítica e por isso mesmo repetidores de mantras contidos em publicações desavergonhadas, mas o que de fato preocupa são os dois polos caolhos que só contribuem para que não se chegue a lugar algum.

De um lado os da situação, que se recusam a enxergar que estamos em pleno processo de apodrecimento da decência. Oportunamente falarei de forma mais esmiuçada sobre o assunto, com base em minha vivência como auditor, já que o assunto exige detalhamentos que me levariam a escrever um tratado, mas por ora basta dizer que temos, sim, corrupção endêmica praticada no presente e no passado recente e, enquanto membros do Executivo já identificados nas investigações – além dos Sarneys, Renans e outros insetos-, permanecerem isentos de responsabilização, teremos a certeza de que reina a impunidade neste triste e belo país.

Mas essa serpente tem duas cabeças, uma em cada ponta. Do outro lado reina absoluta a galera do ‘quanto pior, melhor’, que até ensaiou a excomunhão do Chicão, nosso papa velho de guerra, mas parece que a prudência mandou pisar no freio.

Essa turma padece da síndrome do pó de arroz e resolveu tentar a sorte no tapetão, que ficou conhecido como 3o turno nas últimas eleições. Levantaram suspeitas (todas insuspeitas) sobre a manipulação das urnas eletrônicas que elegeram Dilma, mas inocentaram as urnas que elegeram o Alckmin, uma parcela mais atentada levantou a bandeira de um golpe militar pós-moderno, a que deram o prosaico nome de Intervenção Militar Constitucional (lindo!) e de fato demonstram acreditar que é a salvação da lavoura. Reza a lenda que os milicos sempre estiveram acima de qualquer suspeita, todos são honestos e só mataram os que mereciam ser assassinados, como bem esclareceu o músico de QI alto sem bagagem Roger Moreira, no entrevero que teve com o escritor Marcelo Rubens Paiva. O plano b é o impeachment da presidente da República, cujo processo, segundo asseguram as autoridades facebookianas, pode ser iniciado sem maiores problemas, porque ela é feia e eu não gosto dela.

Estes são os dois tipos dominantes, que obviamente dão origem a subtipos.

Não se trata, porém, de reles confronto de idéias. O que observo com mais preocupação é o ódio que permeia as manifestações de lado a lado, como se não nos bastassem as guerras entre aquelas quadrilhas sustentadas por agremiações esportivas e que levam a alcunha de torcidas organizadas.

Dia desses, por ter me posicionado a favor de uma melhor distribuição de renda e maior taxação das grandes fortunas, ganhei um chapéu de burro e crachá de petralha. Até fiquei feliz, porque acho que seria menos honroso jogar no time da galera do bolsa empreiteiro, mas continuo achando que essa polarização é de todo desnecessária. Eu defendo as cores da chamada ‘esquerda caviar’, e fiquei sabendo disso pela boca de um ilustre representante da ‘direita pão com ovo’. Vai entender, né?

Pela primeira vez exponho abertamente minhas convicções e preocupações. Fiquei na moita não por medo, mas porque os fatos do dia-a-dia me indicam que não vale a pena discutir com radicais de esquerda e de direita, em boa maioria simples gado que não tem lastro cultural ou histórico que permita ir além das palavras de ordem.

Este assunto não se encerra por aqui.

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SANFONA

Desde que me conheço por gente (isto nunca ocorreu, é só força de expressão), ou pelo menos no período compreendido entre a adolescência e as beiradas do portal do meio século, vivi uma situação assaz monótona: pressão 12×8, 80 batidas por minuto quando o coração não estava apaixonado, colesterol legal e 72 quilos. Era como uma cláusula pétrea, qualquer alteração seria vista como um sacrilégio.

Mas sempre tem o “até que”.  Em 2008 eu resolvi dar uma conferida no meu sangue bom e descobri que era um dos ilustres portadores do vírus da hepatite C. Considerando a literatura médica a respeito e meu modus vivendi, a conclusão era no sentido de que eu tinha contraído o tal vírus havia cerca de 28 anos, após uma transfusão de sangue. Caraca!

Isto é história antiga, que já abordei em alguns posts como este, mas parece que ainda não falei de um assunto pós-tratamento. Aliás, o tal tratamento equivale a tomar veneno de cobra para combater soro antiofídico, e provoca uma tonelada de efeitos colaterais. Um deles foi emagrecimento: nos  últimos 90 dias até a última dose fui perdendo cerca de três quilos ao mês, e ainda continuei afinando até chegar aos 60 quilos. A esta altura eu era uma réplica do mapa do Chile, uma espécie de Marco Maciel piorado.

Além do desconforto em ventanias, tive que renovar o guarda-roupa porque pulei do manequim 42 para o 38 sem escalas. Morri numa grana preta. A causa do emagrecimento, descobri depois, foi o completo despirocamento da tireóide, o que explica também os momentos de taquicardia e a taxa de colesterol, que resolveu ficar uma gracinha. Hipertireoidismo brabo.

Comecei o tratamento da tireóide, inaugurando a fase do estica-e-puxa. Tomava o medicamento e de repente o hiper virava hipo, aí eu engordava. Mas hipo também não é legal, então a médica alterava a dose e eu voltava ao hiper e emagrecia. Glândula rebelde, segundo foi diagnosticado. Como a situação era perigosa, acabei me submetendo a um procedimento de choque com o uso de iodo radioativo, e aí eu me tornei um hipotireóidico juramentado. Comecei a recuperar o peso, mas tomando medicamentos para tentar empatar o placar. 

Neste caso específico, o nem-nem é o melhor dos mundos: nem hiper, nem hipo. O problema é que persigo esse ideal de perfeição há mais de dois anos, por enquanto ainda sem sucesso.

A balança ameaça apontar inacreditáveis 80 kg (só falta um) e o manequim 38 passou a fazer parte de um passado recente e incômodo.  Já tive que novamente renovar o guarda-roupa, porque as roupas que tinham se tornado enormes foram doadas. Tudo bem, parcelamento no cartão é pra essas coisas, mas o que se fez de fato urgente e preciso foi atender às lamúrias de Androceu, meu parceiro velho de guerra, que andou tendo crises de claustrofobia e me acusava de aplicar-lhe diariamente um mata-leão.

A solução teve até um certo viés ecológico, porque no fim das contas voltei a criar o bicho solto: comprei uma dezena de cuecas tamanho G, não se descartando o GG nas eventuais manifestações de carência afetiva.

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HIGHLANDER

Eu andei falando sobre meu pai neste cafofo – quem não leu, clica aqui – mas acabei me esquecendo de adicionar o detalhe da teimosia, que foi se avolumando ao sabor da sobreposição das décadas no lombo.

Antes, uma correção: ele completou 82 e não 84 anos em outubro passado. É, eu às vezes também acuso os golpes do calendário.

O velho é pernambucano de Caruaru, onde mora minha irmã, cunhado, aderentes e a sobrinhada. Todo janeiro, há vários anos, boto o patriarca num avião para a visita anual sagrada ao torrão não menos sagrado, ocasião em que ele revê todos os familiares, curte uma praia e detona uma coleção de latas, a maioria de cerveja mas desconfio que também não livra a cara da Pitu. Em 2014 a coisa foi um pouco diferente: meu tio Jorge, seu irmão, saiu de São Paulo, onde mora, passou em Brasília, apanhou meu pai e seguiram para Pernambuco de carro. Como no mundo oceânico há os chamados ‘lobos do mar’, imagino que a viagem deles tenha sido uma revisita de dois velhos ratos de estrada a seu antigo habitat. Mesmo nunca tendo trabalhado juntos, ambos foram caminhoneiros durante décadas.

A coisa deve ter sido muito divertida para os dois, porque combinaram repetir a dose este ano. Para desespero do lado de cá, diga-se, já que meu tio é dois anos menos jovem que meu pai. O combinado, por sua vez, tinha requintes de crueldade: meu pai sairia de Brasília, iria até São Paulo, mais especificamente Mauá, e de lá partiriam. Só o trecho entre SP e Caruaru são cerca de 2.500 km.

Minha mãe, que nunca foi fã sequer das viagens aéreas (só topou ir uma vez), ficou zureta com as idéias mirabolantes dos dois malucos. Conversamos com meu pai, expusemos os riscos, lembramos a ele que os anos se passaram e os reflexos já não são os mesmos, pedimos, ponderamos e no dia dois de janeiro o velho montou em seu Corolla rumo à paulicéia. O botão do foda-se dele é grandão.

Passamos o réveillon em Brasília, mas já no dia seguinte tivemos que retornar a Goiânia, porque Eliana não teria folga na sexta-feira. Lá pelas 10 da manhã o telefone tocou e era meu irmão do outro lado, para me informar que meu pai tinha capotado o carro mas sem detalhamentos sobre o estado dele, apenas uma informação de que estaria bem e sob cuidados médicos em um hospital da cidade de Uberlândia/MG.

O celular dele só dava caixa postal, então tive a ideia de tentar alguma informação junto à Polícia Rodoviária Federal. Liguei no posto da BR-365, em Uberlândia, e me confirmaram que não só meu pai estava milagrosamente bem, como o carro havia sido encaminhado para lá. Até a véspera, sem um único arranhão; no dia seguinte, sucata:

Carro

O mais angustiante era não saber para qual hospital meu pai tinha sido encaminhado, eu ora pegava as chaves do carro para ir às escuras para Uberlândia, ora voltava para o sofá em frente ao telefone na esperança de receber notícias. Após meia hora de sofrimento o telefone toca e recebo as informações de que precisava.

Pé na estrada, eu tinha cerca de 350 km para vencer.

Como já era tarde de sexta-feira e o policial rodoviário me avisou que os procedimentos para liberação do carro só poderiam ser feitos em horário comercial, parei primeiro no posto da PRF na entrada da cidade. Fui super bem recebido e atendido, a papelada necessária foi preenchida e logo estava na porta do Pronto Socorro do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia. O nome é pomposo, mas o prédio parece não resistir a uma sopradinha do lobo mau.

Ao me identificar para a moça da recepção percebi que meu pai estava de fato ali: “ah, é filho do Seo Otávio?, ele está muito bem (homem forte, né?, ele é sempre bem-humorado assim?, 80 e tantos anos e com aquela saúde, benzadeus, etc), já conversamos muito, que coisa né, ainda bem que blá-blá-blá…”

Meu pai estava com o rosto um pouco inchado, principalmente no nariz e na região dos olhos, provavelmente por ter metido a cara no volante. O acidente foi causado por um motociclista (cuja mãe é uma santa) que invadiu a estrada no embalo que vinha de uma saída de fazenda e meu pai, para não passar por cima, meteu o pezão no freio e acabou perdendo o controle do carro. Nem ABS nem airbag funcionaram, legal né?

Saldo da farra: fratura do esterno, sem a necessidade de procedimentos médicos, leves escoriações nos braços e uma das pernas e a cara de quem mexeu com mulher de pugilista. Pelas circunstâncias, um lucro exorbitante.

Ainda assim os médicos me avisaram que não dariam alta naquele dia, porque era necessário aguardar mais 24 horas em observação. Nós dois sem fome (meu pai pelo menos estava no soro glicosado), passamos o resto do dia sem comer nada. Depois das nove da noite meu pai dormiu pesado e resolvi procurar um hotel, principalmente porque precisava ligar para um monte de gente para repassar as notícias e a maravilhosa TIM simplesmente não funciona em Uberlândia, uma das cidades mais importantes de Minas Gerais. Tentei utilizar o orelhão que fica em frente ao estacionamento do hospital, mas fiquei com a nítida impressão de ter retornado ao início do Século XX. O máximo que consegui foi ouvir alguém do outro lado gritando “alô, alô, alô…”.

Acho que estava meio cansado, acordei mais tarde do que gostaria. Cheguei no hospital e lá estava Seu Otávio, ainda fantasiado de paciente mas já liberado. Conversei mais uma vez com os médicos e enfermeiras, recebi as orientações necessárias e providenciamos o retorno para Brasília. 

Ainda que o prédio do complexo hospitalar esteja em ruínas, é justo destacar o excelente atendimento que meu pai recebeu, além da consideração e zelo de médicos e enfermeiros que fizeram questão de me colocar a par de tudo. É um hospital-escola, a maioria ali era de residentes, mas saí de lá com um pouco mais de esperança. Pelo menos por enquanto essa molecada está a fim mesmo é de honrar o juramento a Hipócrates, duvido que algum deles esteja pensando em comprar um leito de UTI para alugar, arrumar um emprego público só para bater ponto e correr para o consultório próprio ou mesmo colocar uma prótese de madeira e cobrar do SUS ou plano de saúde o equivalente a uma peça de titânio.

Durante a primeira hora de viagem meu pai dormiu no banco de trás. Quando acordou já estávamos próximos a Catalão e seu celular tocou. Era meu tio, que queria saber como ele estava e avisar que tinha decidido fazer a viagem em seu próprio carro. Disse que na ida passaria por Brasília para uma visita.

Abasteci o carro, fizemos um lanche rápido e novamente ganhamos a estrada. De repente o velho pega o telefone, digita uma infinidade de números e diz: “Jorge, cabe mais um no seu carro?” Fiquei entre incrédulo e atônito. ‘Velho, tá doido?, saiu do hospital hoje e já quer viajar amanhã?’ Acho que meu pai encara a vida de forma mais simples. “Tô me sentindo ótimo, ué!”

A Terceira Guerra Mundial esteve prestes a eclodir quando chegamos, mas acho que nem a lábia do Maluf convenceria meu pai a mudar de idéia.

Ontem ele me telefonou. Estava na praia, perto de Porto de Galinhas, paparicado pela filha, netos e bisnetos, só lamentando que ainda tinha alguns dias de lei seca a cumprir. Feliz da vida.

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O BESTÃO

Assim que acabou a Peppa eu desliguei a TV e resolvi buscar nas internets notícias quentes do Brasil e do mundo. Não achei muita coisa que preste, mas pelo menos pude constatar que ainda existe aquela figura caricata que atende pelas iniciais FHC. É que o Aecim nunca mostrou a criatura no horário político que dizem ser gratuito, então pensei que o bico doce que lecionou na Sorbonne tivesse finalmente conseguido a cidadania norte-americana, livrado nossa cara e passado a dar palpites na vida sexual da Michelle Obama. Desconfio que o Aecim tava era com vergonha, feito o Serra.

Para meu desencanto o homem ainda é brasileiro e, pior, continua convicto de que está liberado para falar aquela bobajada a que sua boquinha de ornitorrinco engravatado se acostumou a cometer impunemente. Fiquei sabendo que ele ainda respirava graças ao mais novo barro que soltou por via oral.

Em 1998, quando seu internacionalmente conhecido ego era lustrado pela faixa presidencial, o quatrocentão soltou uma pérola de um lado inesquecível e de outro fedendo a rabo dormente, ao dizer que “fiz a reforma da Previdência para que aqueles que se locupletam da Previdência não se locupletem mais, não se aposentem com menos de 50 anos, não sejam vagabundos em um país de pobres e miseráveis.” Tá certo que perto dele sou pouco mais que um alfabetizado mequetrefe, mas me pareceu que ele falou merda. Primeiro porque vivia dizendo que era o herói dos lascados (que graças a ele teriam deixado de ser lascados) e, de repente, se refere a um país de pobres e miseráveis que eu imagino ser o Brasil. Segundo porque ele mesmo se aposentou mais ou menos 12 anos antes da idade limítrofe da vergonhosa locupletação acompanhada de vagabundagem.

Até onde conta nossa história, ele teria sido aposentado compulsoriamente pela ditadura aos 37 ou 38 anos de idade. Mas, por coerência e para não ser auto-considerado um vagabundo, poderia ter dispensado os proventos, né não? O chato nisso tudo é que eu, uma vez cumprido o contrato que firmei com a Previdência Social e contribuído ao longo de 36 anos e dois meses, me aposentei aos 51 e de imediato fui enquadrado como mais um vagabundo-locupletante do FHC-que-se-aposentou-com-38-anos-mas-não-é-vagabundo-porque-não. Ao inseto tucano, uma pequena resposta-homenagem:

 

Esta semana fomos agraciados com mais uma pérola, graciosamente oferecida pelo boca murcha: segundo sua massa cinzenta festejada nos meios intelectuais, Fiesp incluída, “O PT está fincado nos menos informados, que coincide de ser os mais pobres. Não é porque são pobres que apoiam o PT, é porque são menos informados”. Em miúdos, Minas e Rio de Janeiro são estados cuja população é majoritariamente imbecil; somente São Paulo, a locomotiva do Brasil, possui eleitores realmente conscientes e inteligentes. Os estados do nordeste, então, são o cocô do cavalo do bandido. Aí aparece aquele bando de idiotas raivosos postando mensagens racistas, etnocentristas e xenofóbicas, e a tucanada faz cara de paisagem.

Eu sempre tive certa desconfiança dessas pessoas excessivamente teóricas, porque vivem num mundo à parte e demonstram alguma dificuldade no mundo físico. O boca de bagre não foge à regra, e deu uma pisada na bola de ruborizar qualquer malandro iniciante. A certa altura de seu reinado, quando catava o Malan e ia a NY levar chicote no lombo, se engraçou com uma jornalista da Globo. Sim, um caso típico de chapéu de vaca em cima de dona Ruth. Ocorre que a danada apareceu grávida, então a Globo, toda solícita, transferiu a senhorita para o exterior para abafar o caso. Justiça seja feita: FHC assumiu o baby, passou vários anos pagando pensão, segurou a peteca junto à primeira dama. O problema é que um exame de DNA comprovou que o filho não era dele, após 18 anos de pensão!

Aí um corno de amante se dá o direito de chamar os outros de burros, vê se pode!

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FIM DE FÉRIAS

É meio esquisito um aposentado-que-não-faz-nada sair de férias, mas aconteceu. E eu nem pedi. Finalmente minhas férias não solicitadas terminaram na tarde de hoje, alguns minutos antes da aula de francês.

O caso é que o WordPress resolveu me dar um calote, numa prova de que é muito mal agradecido porque só o que eu fiz foi atualizar a plataforma para a versão 4.0. Daí o desinfeliz travou tudo feito um jegue e passou a fingir que não me conhecia. O máximo que eu consegui nos últimos 25 dias era ler as baboseiras que já publiquei, e só. Deixei de ser o administrador do blog, todos os ambientes restritos que tentei acessar me trataram como se eu fosse um turista latino em aeroporto americano. Virei passageiro.

Mexi, fucei, dei porrada na mesa, busquei ajuda com São Google e acabei me rendendo ao suporte do UOLHOST. Fui cozido esse tempo todo em banho-maria, “faz isso, faz aquilo, limpe o cache, atualize o browser, qual é a versão do Chrome?, estamos vendo aqui que está tudo certo com seu blog, a página está carregando normalmente, senhor, algo mais senhor?, o UOL agradece, senhor”.

Desde o início eu sabia que a página estava carregando normalmente, e informei isso no primeiro contato. Até que me lembrei de um cara porreta que me ajudou muito na construção do blog. Mandei um e-mail para o Hamilton com as informações que detinha, e ele começou a romper a trilha. Sugeriu que eu pedisse ao UOLHOST que informasse os motivos por que eu não conseguia o acesso por FTP. A resposta:

Prezado Cliente,

Em atenção a sua solicitação, informamos que o serviço de UOL HOST BLOG não permite acesso por FTP ao ambiente.

Qualquer dúvida ou dificuldade, entre em contato novamente através deste chamado ou com os canais abaixo:

– Chat Online: http://uolhost.com.br/atendimento-online.html
– Telefone: Número 4003-9011 (Capitais e Regiões Metropolitanas) ou 0800 881-9011 (Outras Regiões)

Pedimos sinceras desculpas por eventuais transtornos que lhe tenham sido causados.

Permanecemos a disposição para apoio,

O plano B seria o acesso pelo MySQL, que é um banco de dados até simples, mas que permitiria talvez entrar sob a pele do blog e desfazer algumas alterações de plug-ins recentes e, assim, com alguma reza, conseguir desbloquear. Então, pedi os dados de acesso ao MySQL. A resposta:

Prezado Cliente,

Em bases de dados geradas por aplicativos não há possibilidade de editá-los.

Também não há como fornecer um backup do banco de dados num plano de Blog.

Permanecemos a disposição.

O legal nisso tudo é que eles permaneceram o tempo todo à disposição, apesar de não terem resolvido p*%$@ nenhuma. Passei ontem essas informações nada alvissareiras para o Hamilton, que me devolveu hoje o blog desbloqueado, desatualizado, lindo e maravilhoso. Sei lá como ele conseguiu, só sei que é fera.

Então, é isso: assim que der publico alguma coisa que preste, mas não pretendo falar de eleição, talvez dos prejuízos causados pelo fanatismo de todos os lados que permeia estas eleições.

Eu tinha uma matéria legalzinha sobre um restaurante razoavelmente acessível para as pessoas com deficiência aqui em Goiânia, mas as fotos estavam em meu celular que, por infelicidade, morreu afogado. Pretendo retornar lá e fazer novas fotos, aí publico. Além de tudo o cardápio de lá é pra comer rezando.

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REFORMA DA REFORMA

Li estes dias no Portal Imprensa a notícia de que estaria para ser avaliada, pelo Senado Federal, uma proposta de nova alteração da língua portuguesa, desta feita na grafia. Querem detonar o H inicial (passaremos a escrever ‘omem’, ‘oje’, ‘elicóptero’), o U quando não pronunciado (‘qero’, ‘qinze’, ou ‘kero’, ‘kinze’, sei lá) e outras coisas do gênero. Acho que o resultado será nivelar os livros de Câmara Cascudo e João Cabral de Melo Neto com as postagens adolescentes do facebook, apesar de terem dito que a intenção é facilitar a alfabetização, que consome tipo 400 horas-aula ao final do ensino médio. Para ler a matéria, clique aqui.

Os defensores da ideia ainda afirmam que os alunos saem do mesmo ensino médio sem saber ler, o que é fato. O que também é fato e foi abordado en passant é a ausência do hábito da leitura, que poderia permitir até a ousadia de uma redação. Nenhuma alma se dispôs a analisar nossa qualidade de ensino desde o fundamental e a falta de incentivo, cobranças aos alunos e inclusão nos conteúdos programáticos da leitura e interpretação de livros literários. Também não me lembro de ter lido sobre o custo de atualização de todo o acervo literário, técnico e pedagógico presente.

Particularmente me junto a uma maioria de jornalistas, que refutam a necessidade de nova alteração do português aqui falado, cantado, escrito e frequentemente judiado.

Numa dessas redes sociais o assunto foi abordado e, como é comum ocorrer, as pessoas deitaram comentários. Dentre eles um escrito totalmente em shakespearês, cujo autor de nome bem abrasileirado diz que só utiliza o inglês, que é muito melhor para pesquisas no Google e reconhecimento eletrônico da fala. Também disse que acha absurdo manter um idioma nascido do latim, uma língua morta, e que pouco lhe interessa o que poderá vir a acontecer com nossa língua portuguesa. Ante minhas considerações de que tais vantagens arrancaram de meu espírito a interjeição ‘grandes merdas’, que um dos pilares da cultura de um povo é o idioma e que não vejo razão para renegá-lo, o cidadão retrucou em português dizendo que se referiu ao inglês porque nós não sentimos orgulho de nosso idioma e, ao invés de aprendê-lo, o reduzimos.  Também disse que o inglês é motivo de orgulho para seu povo (fiquei na dúvida se se referia à Inglaterra ou aos EUA) que é mais rico culturalmente do que nós, pobres tupiniquins de tanga, e o exporta para outros países.

O carinha trabalha com software e, como sei que linguagem de programas de computador é mais Maria-vai-com-as-outras que pele de camaleão, relevei. Resolvi não retrucar, passei da idade de bater boca virtualmente.

Mas fiquei matutando sobre as afirmações do colega de comentários e ainda acho que ele está equivocado. Não acho que ingleses ou americanos tenham uma cultura mais rica do que a nossa. Principalmente os norte-americanos são muito bons em propaganda, além de ainda dominarem economicamente o planeta em diversas frentes. É claro que isto faz muita diferença.

A definição mais abrangente e aceita para cultura é o conjunto de costumes, sistemas, leis, religiões, produção e tradições artísticas, culinária, ciências, crenças, mitos, folclore. Assim, é claro que há muito que ser feito no tocante a certos costumes, que fazem de nós um povo merecedor de críticas. Nos falta educação e, por consequência, senso de cidadania. Um dos resultados mais sensíveis disso é a falta de civilidade, que se traduz em egoísmo e na facilidade com que jogamos lixo na rua, não respeitamos os direitos alheios, poluímos ruas, parques, rios e mares, estacionamos nossos carrões em vagas que não nos pertencem, paramos sobre a faixa e não respeitamos o pedestre. Nossa falta de cidadania permite grassar o jeitinho, o ‘cafezinho’, a sonegação. Nós nos acostumamos com o ‘rouba, mas faz’, e fomos doutrinados a não questionar os chamados poderosos porque não é de bom tom. Também não valorizamos nossa memória.

Por outro lado, não conheço país algum no mundo que tenha o boi bumbá, o bumba meu boi, Cora Coralina, as Cavalhadas, catira, sincretismo religioso, carnaval, forró pé-de-serra, Martinho da Vila, chimarrão, feijoada, Drummond, bossa nova, literatura de cordel, tudo dentro de um único território e com uma única língua e vários sotaques.

Nós somos culturalmente pobres ou péssimos em propaganda?

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SINISTRO…

Sei que não é de bom tom, por isso não vou lembrar aos israelenses que – de acordo com entrevista concedida por um professor da UFRJ à Globonews – foi sua ala ultradireita (aquela que ainda hoje está no poder) e o não menos glorioso Mossad quem, há vinte anos, praticamente criou o Hamas. Originalmente sua criação tinha o objetivo de sacanear o Arafat e sua OLP, mas aos poucos a criatura foi ganhando alma, virou partido político, elegeu um monte de gente principalmente na Cisjordânia e, no melhor estilo Jérôme Valcke, deu um chute no traseiro dos criadores.

De certa forma foi bom negócio para Israel, porque enquanto estiver combatendo os malucos do Hamas, não precisará colocar em pauta as reivindicações dos palestinos de Gaza, que incluem a retirada de colonos que foram assentados após a expulsão de milhares de palestinos de suas terras, além da retirada das tropas de Gaza y otras cositas más. Mas acho que não deveria estar falando isso, porque o povo de Israel é muito melindroso, é perigoso se sentir ofendido até se eu disser que são judeus.

O governo brasileiro se atreveu a dar pitaco e deu no que deu: aquele porta-voz, que mistura no mesmo discurso bomba com futebol e é a cara do pai do Kick Buttowski, soltou os cachorros lutadores de Krav Magá, nos chamou de anões inexpressivos e ganhou o importantíssimo apoio da galera da Veja, cuja capa desta semana está um primor:

Capa da Veja desta semana. A revista é da opinião de que o Brasil não tem que se meter com o genocídio promovido pelos judeus.

Capa da Veja desta semana. A revista é da opinião de que o Brasil não tem que se meter com o genocídio promovido pelos judeus.

Na figura, imagem de Harold, dublê de pai do Kick Buttowski e porta-voz bobinho de Israel.

Na figura, imagem de Harold, dublê de pai do Kick Buttowski e porta-voz bobinho de Israel.

Tem uma coisa que me intriga: se Israel detém tecnologia de última geração, a ponto de dispor de um sistema que se encarrega de detonar as bombinhas arremessadas pelos babaquaras do Hamas, além de outras situações em que restou comprovado o formidável desenvolvimento científico-tecnológico do país, não seria mais fácil, barato e com milhares de corpos a menos se resolvesse simplesmente detonar o real inimigo, que é o próprio Hamas? Poderia ser uma ação por terra mesmo, com o efetivo e as armas que tem, e em questão de – poucos – dias, o Hamas seria reduzido a um triste capítulo da história da humanidade. Sobraria, então, tempo para limpar outro triste capítulo da história, mas aí seria necessário que Israel reconhecesse a qualidade humana dos palestinos, sua necessidade de autonomia e de ter uma pátria para chamar de sua, não esquecendo que, pelas convenções internacionais, seu território é inviolável.

Algo me diz, porém, que o buraco é mais embaixo. Tal e qual menino birrento e mimado, Israel se vale do regimento da ONU que só permite determinadas resoluções após votação unânime, sabendo do voto sempre amigo do não menos pernicioso governo americano.

Ninguém questiona o direito à própria defesa. Mas quando se produzem 1300 corpos, a maioria de crianças, mulheres e idosos, os chamados civis, além de milhares de feridos e mutilados de um lado e 55 mortos, sendo 52 militares do outro, peço vênia para imaginar que talvez a coisa esteja meio desigual, tipo 7×1 como disse o idiotinha. Se existisse ONU, alguém de lá chamaria isso de genocídio, crime de guerra, limpeza étnica.

Assim, Israel se sente livre para testar novas armas, inclusive as proibidas como as bombas de fósforo. Como se sabe, do ponto de vista da lucratividade a indústria de armamentos dá o maior pé. Em se tratando de um povo belicoso que domina os bancos e a mídia no mundo, quem haverá de se indispor impunemente?

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MEU VELHO

Em outubro seo Otávio, meu pai, completará 84 primaveras. Vive às turras com minha mãe, de 78, devido à sua irresistível inclinação para uma cervejinha. Ou uma caixa, se possível. Minha mãe não tolera o álcool e tem lá seus motivos mais que justificáveis, já que perdeu o pai e um filho, meu irmão mais velho, para a marvada.

O velho está aposentado há algumas décadas, mas nunca conseguiu ficar parado. No início da aposentadoria vivia embaixo dos carros da vizinhança (todo motorista profissional com mais de 30 anos de volante é também mecânico), ou ajudando a levantar um muro, pintar uma parede. Nunca cobrou nada, mas o pagamento vinha na forma de uma gentileza aqui, outra acolá. Política de boa vizinhança deve ser mais ou menos isto. Hoje já não tem essa disposição toda, e se tornou um devorador de livros – inclusive os clássicos -, detonador de revistas de palavras cruzadas e jogador de vídeo-game. Isso tudo entre uma latinha e outra.

A vida toda foi muito correto, e me alegra a consciência de que herdei isso dele. Herdei também um desvio congênito de coluna, mas não se pode ganhar sempre. Acho que o mais significativo que puxei do ácido desoxirribonucleico do velho foi o otimismo, a socialização automática e uma boa dose de irreverência. Também a brabeza, nas poucas oportunidades em que foi necessária.

Fui o caçula até os 16 anos, quando nasceu o bródi Christiano. A história do nascimento do carinha dá bem a dimensão da façon de vivre de meu pai. Naquela época ele era funcionário público do Estado de São Paulo e trabalhou na representação de SP em Brasília até se aposentar. Era a embaixada do Maluf, Quércia e outras aves de rapina que habitaram o Palácio Bandeirantes e iam regularmente a Brasília em busca de dindim. Como o Hospital do Servidor Público de São Paulo ficava a mais de mil quilômetros, a representação do governo de SP em Brasília firmou convênio com um hospital, meio capenga, que vez por outra era cancelado, para atendimento aos servidores locais.

Numa dessas minha mãe entrou em trabalho de parto. Correria. A primeira parada foi um hospital no Plano Piloto, que alegou não ter condições de atendimento. Então, jogaram minha mãe numa ambulância e correram talvez todos os hospitais públicos do Distrito Federal. Minha mãe gemendo. Meu pai pediu então ao motorista da ambulância que se dirigisse ao primeiro hospital procurado, que era o conveniado. Em lá chegando, pegou uma cadeira e, no meio do salão, colocou minha mãe sentada, avisando aos presentes assustados que dentro em pouco assistiriam ao nascimento de uma criança.

Misteriosamente apareceram médicos, enfermeiras e sala de parto, meu irmão nasceu e nesse meio tempo o convênio foi retomado. Passado o tempo necessário de internação, era chegado o momento de voltar para casa.

Meu pai deixou minha mãe e meu irmão no carro e retornou ao departamento financeiro do hospital para assinar os documentos do convênio. Só que tinha uma surpresinha: foi apresentada uma fatura cobrando alguns procedimentos em tese cobertos pelo convênio, o popular ‘por fora’. O velho achou que era desaforo, bateu o pé e disse que a cobrança era ilegal e não pagaria, virou aquele angu de caroço até que uma alta autoridade de lá sentenciou: se não pagar não poderá levar a criança para casa.

Meu pai, então, deu o mata-leão na incrédula equipe de cobrança: “pois então fiquem com essa criança aí, que eu não quero mais”. E saiu porta afora, sem dar ouvidos aos chamados desesperados da galera de branco, que não sabia que já estavam todos no carro.

Acho que até hoje devem se perguntar sobre aquele recém-nascido que desapareceu da maternidade, após ter sido abandonado pelo próprio pai.

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TEMPLUM ARGENTI

Eu já tinha achado bem esquisito que a LBV, aquela entidade que possui um monte de gente chata encarregada de me aporrinhar pelo menos uma vez por quinzena para pedir donativos para suas crianças, tivesse erguido em área nobre de Brasília um templo nababesco. Tanta ostentação deve ter custado bem mais de 300 reais, e eu passei a não ver sentido em contribuir para aquela contradição em forma de entidade filantrópica.

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Quando imaginei que já tinha visto de tudo neste mundo, eis que a Universal supera com sobras a concorrência, com a inauguração do Templo de Salomão, obra multimilionária que vem sendo questionada até mesmo por líderes evangélicos. Em reais eu acho que até nem consigo dizer quanto custou, mas passando para o dólar seguramente foi um monte.

Templo de SalomãoSegundo a própria igreja, o templo está implantado em um terreno de aproximadamente 28 mil m² na Avenida Celso Garcia, no bairro do Brás, em São Paulo (SP), e o complexo, que tem quase 74 mil m² de área construída e dividido em dois grandes blocos interligados por uma nave, pode abrigar confortavelmente um pouco mais de 10 mil pessoas sentadas.

A cerimônia de inauguração, prevista para este mês, deverá contar com a presença ilustre de diversas autoridades, incluindo a presidente Dilma, deputados da corrente evangélica e outros menos cotados, além daquela galera que deve estar morrendo de raiva de trabalhar na Record. Ao que parece, Geraldo Alckmin e Fernando Haddad ainda estão avaliando se pulam no fogo ou na frigideira.

A IURD, porém, dá sinais de que, por opção, dificilmente haverá culto com casa cheia, apesar da capacidade. É que virou moda o padrão Fifa, o que significa que pobre não entra. A lista de restrições à entrada no tempo é grande, destacando-se trecho de um comunicado distribuído aos fiéis: “Pedimos às visitantes que não usem minissaias e outros tipos de roupas sensuais. Uniformes de clubes esportivos ou outras instituições, bermudas, chinelos, camisetas sem manga, bonés e óculos escuros tampouco serão permitidos. Vista-se como faria se fosse encontrar socialmente com uma pessoa importante”.

De quebra, para entrar no megatemplo “todos os visitantes serão revistados” e o uso de câmeras, celulares, tablets e qualquer dispositivo eletrônico será proibido. “Haverá local para armazená-los fora do templo”, diz o comunicado. Ainda assim, pelo menos até 2015 não será para qualquer um: ou você é convidado ou participa de caravana, por módicos R$ 45,00, para “se encontrar com o próprio Deus, na casa dele”.

Ou seja, o Deus do Templo de Salomão é muito maior, mais importante e digno que o da capelinha do alto do morro. Palavra de Macedo. Amém.

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TÁ ESQUISITO

Meu altíssimo quociente de imbecilidade vem me causando certo sofrimento ultimamente. Tá difícil entender algumas coisas, fico com vergonha de perguntar e aí a coisa vai desandando como se fosse normal desandar.

Falei aqui recentemente que jamais votaria no Aécio, pela figura em si e pela gang que o segue, mas o Aécio que eu conhecia era aquele que descia o cacete no Bolsa Família e no Mais Médicos, a exemplo de sua caterva.

O que me deixou zureta foi o Aecim falar na Sabatina UOL/Folha/SBT/Jovem Pan que planeja manter esses programas e outros que ‘dão certo’ caso seja eleito.

Como assim, bacuri? A intelligentzia tucana e demônica teria sentido um cheirinho de tiro no pé, após tanto ataque e representações à ONU e OIT?

Fico no aguardo das opiniões do tucano de carreira sobre a política de cotas. Vamos ver se bate com o pensamento reinante entre seus iguais, ou se ele vai caprichar na maquiagem de novo.

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A INICIAÇÃO

Após longo período de desencontros, eis que descubro meu primo Delson no Facebook, e já tivemos um arremedo de retomada de contato, interrompido quando ele foi para o Rio de Janeiro em busca de um terreno fértil para sua arte, e eu me mandei para Goiânia com um objetivo menos nobre: assumir um emprego público conquistado por concurso. Na época morávamos em Brasília e estávamos na faixa dos 20 anos.

Passamos a adolescência juntos, aliás morávamos juntos e, na companhia de meu falecido irmão, aprontamos todas. Vivíamos um período de ditadura militar, nada nos era permitido e simplesmente não aceitávamos aquilo. Então, era um tal de cantar Geraldo Vandré, produzir ou simplesmente assistir a peças de Plínio Marcos e Leilah Assumpção, correr da polícia e seus cachorros nos protestos de rua. Acredite quem quiser, era uma senhora diversão.

Mas nem tudo eram conflitos ideológicos, também tinha o rock pauleira do Deep Purple, Led Zeppelin e toda aquela sonzeira que nos aliviava a alma e enfurecia nossos pais. Em agosto de 2008 publiquei no meu antigo blog um post sobre meu primo e a saudade que sinto dele. Nosso reencontro, ainda que virtual, me refrigerou o espírito e penso que cabe republicar o texto do artigo publicado:

Meu primo Delson aniversariou esta semana e eu simplesmente me esqueci.  Só me lembrei agora há pouco.  Eu estou convencido de que nunca na história deste País houve alguém tão miolo mole como eu para as datas comemorativas.  Querido primo, se te serve de consolo, há uns 10 ou 11 anos eu só me lembrei de que era meu aniversário quando meus pais telefonaram, tipo seis da tarde.

Estava há alguns minutos balançando na rede e olhando pro nada quando me lembrei de seu aniversário, e me lembrei também de uma passagem engraçada de nossas vidas, quando morávamos juntos em Brasília.  Estava eu no auge dos meus quatorze ou quinze anos, cheio de amor prá dar.  Cheio de espinhas, também. Virgem. 

Onde hoje fica Valparaiso, no km. 7 da rodovia Brasília-Belo Horizonte, situava-se um recanto aprazível também conhecido como casa das primas, largamente frequentado pela galera do DF.  Meu primo resolveu me levar lá e, pior, eu topei.  Não me lembro de como chegamos, se tinha ônibus ou fomos de taxi – esta segunda hipótese praticamente descartada pela dureza em que vivíamos – o fato é que de repente eu estava frente a frente com o desconhecido. 

Era um conjunto mal distribuido de casas, estilo faroeste, com as tradicionais luzes vermelhas na porta, cada qual com seu boteco particular e as mulheres circulando ou dançando, outras sentadas ao lado ou no colo dos frequentadores que tomavam cerveja (elas só iam de campari) e meu primo foi à caça para me tirar do atraso. 

Ele fez tudo: achou a criatura, conversou, negociou, pagou, me apresentou, e eu ali, morrendo de vergonha, sem saber onde botava a mão, não conseguia falar nada, mais sem graça que humorístico do SBT.  A impressão que eu tinha era de estar do tamanho de um penico, e meu maior objetivo naquele momento era não ser notado por ninguém.  Não vou dizer que me esqueci da fisionomia da moça, acho que nem cheguei a mirá-la.  Ela me apanhou pelo braço e, desviando daquele monte de gente, rumamos para a área de abate, e até então minha passagem pelo local tinha sido marcada pela discrição. 

Só que meu primo não poderia deixar passar em branco; quando estávamos ganhando o corredor que dá para os quartos ele falou para quem quisesse ouvir: CUIDA DIREITINHO, QUE ESSE É VIRGEM! O aniversariante desta semana se livrou por pouco de ser assassinado naquela noite.

Em outubro estarei no Rio a passeio com a família, e finalmente vou reencontrar meu primo que, assim como eu, passou por maus bocados em passado recente no quesito saúde. Mas como sempre fomos desaforados, vencemos quem estava a fim de nos ferrar.

Beijo, Delson, até lá.

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NO VÁCUO

Mal acabou o thriller ‘Onze homens e uma goleada’, eu ainda nem tinha conseguido deglutir a pipoca com chocolate e já havia no twitter manifestações embolando o meio de campo entre esporte e política. Entre elas uma postagem do arauto da inexpressividade Levy Fidelix, cujo partido nem sei, mas que é candidato a presidente. Tratou de algum assunto como reforma tributária, política ou do sofá, não costumo prestar muita atenção ao que esses caras dizem (afinal, em geral eles não dizem nada).

O que a derrota brasileira de fato despertou em mim foi um temor muito grande de que, à guisa de protesto contra o Felipão e seus comandados, os babacas de plantão aproveitassem para promover baderna nas ruas. Já me chegaram algumas informações sobre isto, por enquanto nada de grande monta, e espero que continue assim. Creio que está mais do que na cara quem são os descerebrados vendidos que se autodenominam black blocs e a quem servem.

Quem leva jeito de também tirar uma lasquinha é o candidato das Geraes, o Garoto de Ipanema. Pode ser que leve algum dividendo à custa do fracasso no esporte, em se tratando desse povinho cretino tudo é possível.

Não tenho candidato para o executivo federal, mas uma certeza me norteia: nunca, jamais e em tempo algum vou dar meu voto para esse playboyzinho cocô, que tem um cavalo como vice e um representante de uma das oligarquias mais podres do nordeste, José Agripino Maia, como coordenador de campanha. Isto sem falar que Armínio Fraga, que recentemente declarou que nosso salário mínimo está muito alto, é cotadíssimo para assumir um ministério num eventual (toc, toc) governo Aécio. 

Na falta de disposição para sair de casa para votar, vou permanecer por aqui jogando paciência. Se tiver que pagar multa, paciência.

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OS TAPADOS

Reconheço que não tenho paciência com gente burra, mas quero esclarecer que essa broxada espiritual é dirigida com exclusividade aos burros por opção ou modismo. Os demais, se o QI não é lá essas coisas por obra e graça da natureza, jogam no meu time e nesse quesito não temos culpa de nada.

Acho que estão na rabeira dessa estirpe os burros remunerados. Chega a ser engraçado isso, mas eles de fato existem e habitam os fóruns de reportagens sobre veículos e, em especial, os de discussão sobre economia e política. Admito que às vezes até me divirto.

Dia desses o UOL publicou reportagem sobre o recém-descoberto mercado de veículos seminovos. Dizia a matéria que, com o valor de um veículo zero km sem opcionais além de travas, vidros elétricos e direção hidráulica, era possível comprar um de padrão superior e completo, com um ou dois anos de uso. Por coincidência eu fiz isso e não me arrependo. A explicação para esse fenômeno é a depreciação muito grande e imediata do bem, assim que bota os pneus na rua. No caso dos zero km para o povão quinem qui eu, entenda-se por completo vidros elétricos somente dianteiros, regulagem de altura e profundidade do volante nem pensar, ABS e airbag só a partir deste ano por força de lei e mais um ‘quase’ aqui, outro ali.

Aí entra a galera do contra. Teve um que jurou só ter trocado um Gol por outro nos últimos seis anos, e que achava normal o preço cobrado pela concessionária. Provavelmente trabalha na concessionária ou é o próprio dono dela, não se descartando a hipótese de se tratar de um engravatado de São Bernardo do Campo travestido de cliente satisfeito. Peguei o Gol para Cristo só como referência, já que os outros são exatamente iguais.

No campo do jornalismo político a coisa não é muito diferente, cabendo ressaltar que são poucos os jornalistas, articulistas e editores comprometidos com a decência. Então, essa massa podre e aparentemente majoritária joga o jornalismo no lixo, trocando-o por uma carreira meio sem pé nem cabeça de ghost writer que mostra a cara. Aí surgem os Reinaldos, Constantinos, Fiuzas e Mainardis da vida, com seu canto monocórdico e absolutamente parcial.

Quando acho justo eu desço o cacete na Dilma. Considero a maioria de seus ministros medíocres e que esse negócio de fazer acordos e negociar apoios é um veneno poderoso. Ocorre que os senhores ensaboados acima citados, caolhos por vocação, não só se recusam a enxergar o que há de positivo no governo como santificam a oposição mesmo quando seus integrantes roubam milhões.

Mas eles têm um mérito: não temem o ridículo. Semana passada meu filho Lucas participou dos jogos anuais promovidos pelo colégio, e eu saí para assistir a uma partida de futsal. A caminho do colégio resolvi ligar o rádio e me dei ao luxo de ouvir um pouco a CBN. De repente o locutor coloca em linha direta o Marcelo Madureira (aquele que acreditou quando alguém disse que ele era humorista) para dizer que achou exageradas as sanções contra o Hannibal Suárez, que a Fifa estava jogando para a torcida, blá-blá-blá. Aí danou a viajar lá longe e disse que eram dois pesos e duas medidas, porque o STF aproveitou a saída do Barbosão pra deixar o Dirceu trabalhar, então o que é que tem o Suárez morder o ombro alheio? Confesso que fiquei mais abobado que o normal com a confissão implícita do ‘comentarista’ que finge não saber a diferença entre tribunal esportivo, Fifa e a mais alta corte brasileira.

Como uma desgraça nunca vem só, em seguida entrou o Arnaldo Jabor, para rechaçar a alcunha de elite branca dada pelos movimentos de esquerda à classe economicamente dominante.

O saco encheu, resolvi pegar um CD e fui curtindo Rastapé e Falamansa até chegar ao colégio. 

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